Pular para o conteúdo

Garganta Virtual: Novo Grito Surge nas Redes Sociais e se Transforma em Campanha pelo Resgate do Cine Excelsior

A notícia sobre a retirada e a venda das cadeiras do Cine Excelsior em meados de novembro parece ter impulsionado um novo movimento pelo resgate do espaço, inaugurado em 1958 e fechado desde 1994. Segundo o cineasta Franco Groia, as primeiras manifestações surgiram nas redes sociais, logo após a publicação de fotos recentes do local no blog Maria do Resguardo. “Resolvemos gritar com as armas que temos: as ferramentas tecnológicas”, afirma o cineasta, que encabeça a campanha Salvem o Cine Excelsior ao lado do arquiteto Alessandro Driê e do Coletivo Sem Paredes.

A repercussão foi maior do que se esperava. Conforme Groia, que se tornou cineasta por morar desde criança no prédio do Excelsior, a coletividade respondeu rapidamente, tanto no mundo virtual quanto no real, ao observar o risco de perder o cinema, ao que parece, para um estacionamento. Mais de mil nomes foram recolhidos em um abaixo-assinado online, além de quase duas mil assinaturas em papel, numa corrente iniciada durante o Primeiro Plano 2011. Paralelamente, diversos artistas e interessados passaram a lançar na rede imagens e mensagens relativas ao imóvel, comprado pelo empresário Ricardo Arbex, proprietário da loja Tecidos Marabá.

O músico Edson Leão, por exemplo, vocalista do Eminência Parda, adicionou fotos de filmes exibidos no espaço, tido como um dos melhores do país até a década de 1990. “Quis afetar as pessoas por meio da memória”, diz Leão. Após a matéria publicada pela Tribuna no dia 17 de novembro, inúmeros comentários de leitores chegaram pelo Facebook.

Como explica Franco Groia, a intenção da campanha é estimular a criação de um centro cultural multiuso, “aproveitando a vocação do lugar para ser uma grande sala pública de cinema”. Na opinião do cineasta, eventos de variados perfis podem ser realizados ali, sem a superlotação das vias do Centro, uma vez que a construção é circundada por muitos hotéis. Gian Martins, membro do Coletivo Sem Paredes, concorda, acrescentando que, com a reativação do Excelsior, a cidade ganharia mais um ponto de cultura. “Esse tipo de sala está morrendo no país, e algo precisa ser feito.” Aos 22 anos, Gian não conheceu o local, que possuía 21 caixas de som, excelente acústica, ar-condicionado central e 1.250 poltronas. “Mas sei do seu valor para a história de Juiz de Fora”, complementa.

De acordo com Alessandro Driê, que acaba de criar a página www.cinemaexcelsior.com.br, outras localidades podem oferecer exemplos positivos. “O antigo Cine Marabá, em São Paulo, foi recuperado e funciona a pleno vapor.” O arquiteto conta que o movimento Salvem o Cine Excelsior surgiu de forma casual, mas foi ganhando corpo ao reunir individualidades. “Esse foi o primeiro cinema no qual entrei”, relembra. Para Gian Martins, se bem utilizada, a internet é capaz de ótimos resultados a favor da coletividade. “Ela concede agilidade e visibilidade às organizações da sociedade civil.”

Em artigo publicado em seu site, Franco Groia defende a sensibilização da Prefeitura para decretar a utilidade pública do imóvel e, posteriormente, retomá-lo com recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES). “O banco, por meio de um programa de financiamento específico, oferece um leque diversificado de instrumentos financeiros voltados para a cadeia produtiva do audiovisual nacional.” Franco cita, entre esses instrumentos, o projeto Cinema perto de você, da Agência Nacional de Cinema (Ancine), como uma real saída para a situação do Excelsior.

De acordo com o vereador Flávio Cheker (PT), além dessa possibilidade, existe o caminho da Lei Rouanet e da iniciativa privada. “Estou iniciando as conversas nesse sentido.” Cheker comenta que o último pedido de declaração de interesse cultural, enviado ao Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Cultural (Comppac) em março, foi indeferido. Alessandro Driê acrescenta que essa conquista seria mais interessante que o tombamento, já que o mesmo poderia engessar o destino do local. Por outro lado, o presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB), Marcos Olender, assegura que existem caminhos para evitar essa questão.

Na última quarta, foi realizado um Fórum do Patrimônio para a apresentação de um parecer técnico sobre o valor arquitetônico do Excelsior, que será encaminhado ao Comppac pelo Salvem o Cine Excelsior, com pedido de reabertura e reavaliação do processo de tombamento e imediato embargo das obras. Em seu laudo, a presidente da Oscip Permear, Milena Andreola de Souza, assegura: “o interior do cinema representa um período, e isso é distinguível claramente, apesar do abandono. O espaço interno, até então, mantinha-se preservado e será mais uma grande perda na arquitetura art-déco da cidade”.

Franco Groia informa ainda que o condomínio do prédio onde fica o cinema promoveu uma assembleia na última segunda e decidiu apoiar o movimento, além de verificar a legalidade das obras, não discutidas pelos moradores. De acordo com a assessoria da Secretaria de Atividades Urbanas (SAU), não existem irregularidades na reforma, que vem sendo fiscalizada. Sobre o barulho fora do horário permitido, a assessoria afirma que o proprietário já foi notificado e assegurou ter encerrado a substituição do piso.

O Cine Excelsior viveu longo período de ebulição. Em 1974, conforme atesta o diretor da Mobz (empresa nacional de cinema digital), Marco Aurélio Marcondes, o lugar assistiu à criação da DinaFilmes quando acolheu a 10ª Jornada Nacional de Cineclube, da qual ele fazia parte. Ele pondera que, apesar da importância da conservação, é necessário levar em conta a modificação nas cidades e a demanda de um novo espaço cultural. “Juiz de Fora possui 14 salas, num total de 2.631 cadeiras. É preciso refletir.”

Na próxima semana, durante a “palhaceata” da Caravana de Palhaços 2011, promovida pelo Mezcla, haverá uma “choradeira” em frente ao Excelsior. Segundo o organizador Marcos Marinho, os participantes pretendem fazer uma verdadeira birra pela possível perda do local. “Não podemos ficar adormecidos e ser comandados pelas questões econômicas”, diz Marinho, que conheceu os filmes de Federico Fellini por lá. “Ainda me lembro do cheiro da sala e dos gongos que tocavam pouco antes de a sessão começar.”

Fonte: Jornal Tribuna de Minas.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *